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O slogan “O petróleo é nosso”, que impulsionou a criação da Petrobras na década de 1950, ficou ultrapassado não pelo tempo, mas pela sanha entreguista daqueles que comandam os rumos do país na atualidade. A estatal petrolífera atravessa um dos piores momentos da sua história, com a perda crescente do monopólio do petróleo e a privatização da principal riqueza descoberta pela companhia nos últimos tempos: as reservas no pré-sal.
Para traçar o panorama atual da companhia e projetar o futuro diante das ameaças do governo Jair Bolsonaro, o programa Faixa Livre conversou com o vice-diretor de Comunicação da Associação de Engenheiros da Petrobras (Aepet) Fernando Siqueira.
Os ataques à empresa pelo capital hegemônico se dão em múltiplas frentes. Uma delas é o projeto de cessão onerosa, que consiste na venda a empresas estrangeiras do petróleo excedente encontrado nos campos do pré-sal, descobertos em 2006 durante a gestão de Lula.
Em 2010, com a promulgação da Lei nº 12.351, conhecida como lei do petróleo, ficou definido o projeto de capitalização da Petrobras e a partilha do pré-sal. O Governo Federal cedeu à companhia sete blocos de exploração que deveriam conter, pelas contas iniciais, uma reserva de 5 bilhões de barris.
“A Petrobras pagou por esse conjunto de blocos US$ 40 bilhões, na época R$ 74 bilhões. Ao fazer essa operação, a empresa também lançou ações no mercado, captou mais R$ 40 bilhões e pagou ao governo com títulos que tinha por conta das privatizações. O governo, com esses títulos, comprou ações da Petrobras, recuperando o percentual de participação que tinha caído para 38% e voltou para 46%. Isso foi muito bom porque permitiu que a Petrobras captasse no mercado, reduziu o que pagou ao governo e com isso pode se capitalizar”, citou o dirigente.
As divergências entre o Palácio do Planalto e a companhia começaram assim que se deram as primeiras perfurações dos blocos na bacia de Santos. Apenas no campo de Búzios, denominado à época como área de Franco, a Petrobras descobriu uma reserva estimada em 13 bilhões de barris.
Já no bloco de Libra foram encontrados, para surpresa de todos, 15 bilhões de barris. Desta forma, em apenas dois dos sete campos adquiridos pela petrolífera, havia um excedente de aproximadamente 23 bilhões de barris de petróleo.
“Assim o governo tirou Libra do conjunto e fez um leilão absurdo que entregou o petróleo a empresas estrangeiras e ficou apenas com 40% do campo”, relatou Siqueira, em referência à primeira privatização do pré-sal, que deveria ter, por lei, todos os recursos obtidos com royalties investidos em saúde e educação.
Ao fim das perfurações dos blocos adquiridos pela Petrobras, excluindo o campo de Libra, chegou-se a um excedente total de 17,2 bilhões de barris. Não bastasse isso, o deputado José Carlos Aleluia propôs ao Congresso a permissão que a empresa transfira a titularidade do contrato do pré-sal com o Governo Federal, desde que reservada uma participação de, pelo menos, 30%.
Sendo assim, dos 22,2 bilhões de barris encontrados pela petroleira nas reservas em perfurações profundas, apenas 1,5 bilhão poderia ser explorado, rendendo lucros ao país.
“Hoje o custo de produção total do pré-sal está na ordem de US$ 25 por barril, incluindo impostos. Se o petróleo estiver a US$ 65 por barril, há um lucro de US$ 40. Multiplicando isso por 20 bilhões de barris, vai dar em torno de US$ 880 bilhões ou quase R$ 4 trilhões. O governo está falando que vai arrecadar US$ 100 bilhões com leilões, mas vai entregar R$ 4 trilhões para os estrangeiros. Veja a lucratividade dessa área, que já tem toda infraestrutura praticamente montada”, alertou o diretor da Aepet.
A engenharia encontrada pelos gestores da administração pública produz outra excrescência: um bloco de petróleo poderá ser explorado por mais de uma empresa simultaneamente, algo único no mundo. “É uma jabuticaba negativa, um absurdo completo”, classificou Siqueira.
Apesar da permissão para a Petrobras participar dos processos licitatórios do excedente na cessão onerosa, a companhia não vem exercendo esta prerrogativa, o que preocupa o dirigente sindical.
“Daí o fato da participação dela no pré-sal ter caído de 60% para 41%. No quarto e no quinto leilões, a Petrobras nem participou em áreas como Uirapuru e outras, que poderiam ter uma reserva da ordem de 10 a 20 bilhões”, avisou.
Na ocasião, a Aepet enviou ao então presidente da estatal Ivan Monteiro um questionamento sobre a não participação da empresa nos leilões.
“E mais, nessa carta, cobramos do presidente uma explicação do porquê ele foi fazer lobby no Congresso Nacional em favor do projeto, contra a companhia, é um caso inédito. A resposta foi absurda, dizendo que foi simplesmente porque o governo pediu, ou seja, uma resposta que não justifica nada”, declarou Siqueira.
De acordo com alguns analistas, a esperança no Governo Federal recai sobre um suposto caráter nacionalista dos oficiais das Forças Armadas que ocupam Ministérios e a própria presidência da Petrobras. Entretanto, o dirigente negou tal expectativa.
“Não estamos sentindo esse nacionalismo na Petrobras. O que estamos vendo é o [presidente general] Castelo Branco querendo vender as refinarias, fez esse aumento do diesel, não sei se está interferindo positivamente. Esperamos que sim, mas não estamos vendo isso concretamente”, analisou.
A Associação de Engenheiros da Petrobras tem tentado promover uma mobilização de deputados, senadores e da cúpula militar que ocupa atualmente o Planalto em torno da defesa dos interesses da companhia e do país.
“Fizemos uma revista que explica a importância do petróleo, da cessão onerosa, e entregamos aos parlamentares. Estamos fazendo um trabalho de informá-los, estou marcando reuniões com os parlamentares do Rio. O Congresso é novo, há uma renovação de 50%, e esse pessoal não sabe muito. Paralelamente estamos enviando essas informações para lideranças das Forças Armadas, essa revista já fez chegar a alguns generais da administração. Por incrível que pareça a nossa esperança é que os militares sejam os reguladores da questão. Se prevalecer a opinião do Paulo Guedes, ele vai entregar o país todo. A Petrobras passa por um projeto de desnacionalização”, completou Siqueira.
INTERFERÊNCIA NO DIESEL
Na última semana, o presidente Jair Bolsonaro surpreendeu e mandou a Petrobras suspender um reajuste no preço do óleo diesel. A interferência do Palácio do Planalto, comum nos governos petistas, recebeu críticas de analistas, lembrando que a política de preços da empresa está ligada à variação do valor no mercado internacional.
O ex-capitão do Exército alegou, entre outras coisas, temer um novo movimento grevista de caminhoneiros. O dirigente da Aepet lembrou que os lucros da empresa na venda do diesel ultrapassam o percentual que é comumente praticado, possibilitando a manutenção de valores menores nas bombas de combustível.
“O Paulo César Lima, ex-assessor legislativo, que foi petroleiro, fez um estudo na época da greve mostrando que o litro de diesel custa para a Petrobras entre R$ 0,92 e R$ 0,93, e estava sendo vendido por R$ 2,30. Então o lucro era superior a 150%. Dentro desse raciocínio, é perfeitamente viável conter o preço porque é um combustível social, responsável pelo transporte de pessoas, alimentos e gera um aumento generalizado em toda a cadeia”, destacou.
Ouça a entrevista de Fernando Siqueira na íntegra:
Entrevista em 15.04.2019