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Editorial – 27.11.2019

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Parece que está tudo combinado. As manchetes de jornais importantes do país como O Globo, Valor Econômico e Folha de S. Paulo são muito semelhantes. O Globo aponta: “Fala de Guedes sobre câmbio leva dólar recorde de R$ 4,24”. O Valor Econômico vai no mesmo caminho e aponta que a “Fala de Guedes faz dólar subir e exige ação do Banco Central”. E a Folha de S. Paulo estampa em letras garrafais “Fala de Guedes sobre dólar e AI-5 provoca instabilidade”.

 

Sem sombra de dúvidas, os pronunciamentos, as falas de Guedes são lamentáveis, mas parece que pode ter alguma coisa a mais do que simplesmente nessas manchetes o repúdio a essas intervenções do atual ministro da Economia. A rigor, existem muitas incertezas sobre a própria agenda econômica de Guedes e Bolsonaro. Isso já ficou claro inclusive quando o próprio Bolsonaro teria dirigido palavras ao Guedes pedindo para que ele tivesse paciência, afinal de contas existem muitas manifestações nos nossos países vizinhos que apontam que se a coisa continua aqui no Brasil do jeito que vai, evidente que daqui a pouco poderemos ter também, e seria bastante saudável isso, manifestações muito fortes para questionar aquilo que vem sendo feito no Brasil e que implica perda da nossa soberania, perda de direitos para os trabalhadores e ataques frontais à Constituição.

 

Enquanto isso, o que temos visto na vida prática é o aumento do desemprego, os problemas da economia, especialmente para o seu crescimento, e uma degradação dos serviços públicos inédita no país, por isso existe muita insegurança. Nesse sentido, é necessário ponderar, em primeiro lugar, a respeito do papel de Guedes na subida do dólar. A rigor, estamos passando por uma mudança importante. Durante muitos e muitos anos, convivemos com uma situação onde tínhamos um dólar baratinho e taxa de juros muito elevadas.

 

Aqui no Brasil, temos como regime cambial o chamado câmbio flutuante. Significa que o valor do dólar é definido principalmente pelo fluxo de entrada e saída da moeda americana aqui no Brasil. Isso que dá base ao tal câmbio flutuante. O que aconteceu nesses últimos 20 anos praticamente? Nós convivemos com esse dólar barato e taxas de juros muito elevadas. Isso estimulava muitas grandes empresas, especuladores com muito poder de intervenção no mercado internacional a irem ao exterior para captar recursos. Isso mesmo, fazer empréstimos em moeda americana pagando taxas de juros muito baixas por que existe uma taxa de juros nos outros países muito reduzida, principalmente em comparação com as taxas de juros que vigoravam aqui no Brasil.

 

Então era um grande negócio para grandes empresas, para fundos institucionais terem captação de recursos no exterior a um custo muito baixo e, ao mesmo tempo, traziam esses dólares aqui ao Brasil para se beneficiar das altíssimas taxas de juros, e isso evidentemente influenciava esse fluxo cambial de entrada e saída de divisas do país. Esse esquema foi alterado, a taxa de juros no Brasil se reduziu bastante e, com isso, essa operação de se procurar ganhar os especuladores com esse diferencial na taxa de juros ficou muito reduzido.

 

Não encerrou-se, porém ficou muito reduzido, e isso é o principal fator que faz com que haja uma mudança no patamar do dólar. Com relação ao AI-5, evidente que qualquer fala nesse sentido tem de ser repudiada. Agora as lideranças do Congresso, o senhor Toffoli ou o senhor Maia, presidente da Câmara, terem se manifestado soa, cá para nós, como uma postura no mínimo hipócrita, me perdoem a palavra, porque, convenhamos, desde que foi deflagrado aquele processo de impeachment ilegal contra a senhora Dilma Rousseff, e aqui não estou defendendo a ex-presidente, apenas estou assinalando que foi uma forçação de barra tremenda a atribuição de um crime de responsabilidade em relação às chamadas pedaladas fiscais, eu mesmo aqui no programa tenho dito que já há alguns anos estamos vivendo um processo de excepcionalidade institucional e tudo isso sob as bênçãos do Supremo Tribunal Federal.

 

Portanto, quando o Dias Toffoli ou mesmo o Rodrigo Maia criticam a menção ao AI-5 feita pelo ministro da Economia Paulo Guedes, me parece que as coisas precisam ser colocadas no seu devido lugar. Não há dúvidas que temos de repudiar qualquer tendência ou vontade de alguns de fazer com que a ditadura retorne ao país, porém, de alguma maneira, essa ditadura está em curso, afinal de contas como é possível renunciarmos à nossa soberania nacional, vendermos boa parte da nossa maior empresa brasileira que é a Petrobras, vender a Embraer, vender o patrimônio público na bacia das almas e, ao mesmo tempo, retirar direitos dos trabalhadores da Constituição como estamos fazendo constantemente e sempre com as bênçãos do Poder Judiciário e das lideranças do Congresso.

 

Portanto, há muito mais coisas a serem investigadas em relação a essa ofensiva que existe nesse momento contra o senhor Paulo Guedes. Existe, na verdade, nesse momento, muitas incertezas com relação à agenda econômica defendida pelo governo Bolsonaro e que tem em Paulo Guedes o seu principal padrinho. Por isso, é necessário que tenhamos muito cuidado para não embarcar em defesas muito mais demagógicas sob o ponto de vista da soberania nacional ou da democracia do que especialmente o que estamos assistindo nesses últimos anos aqui no Brasil. É necessário, em meio à fragilidade da esquerda nesse momento, muito cuidado para que a gente não compre gato por lebre.

 

Ouça o comentário de Paulo Passarinho:

 

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