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Editorial – 19.10.2020

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Que o Jair Bolsonaro é um oportunista da pior espécie, não é novidade para ninguém, mas eu quero aproveitar o espaço editorial de hoje para realçar um tema que eu ainda não cheguei a citar aqui no programa, que é o aparelhamento promovido pelo presidente da República da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), aquela mesma que ele cansou de criticar e ameaçou encerrar as atividades.

 

Exemplo disso foi a transmissão da partida entre Brasil e Peru, pelas eliminatórias da Copa do Mundo, na última terça-feira, que teve os direitos de transmissão comprados pela Confederação Brasileira de Futebol (CBF) de última hora e cedidos para transmissão da TV Brasil, emissora pública. O narrador do jogo, o jornalista André Marques, em duas ocasiões durante o confronto saudou Jair Bolsonaro, em uma cena que causou repulsa a quem acompanhava o jogo. Postura típica dos regimes totalitários que se utilizavam de emissoras estatais para venerar seus líderes e propagar seus discursos.

 

A respeito disso, eu gostaria de ler a coluna do jornalista Bernardo Mello Franco, publicada ontem pelo jornal O Globo, que ganhou o título “TV Brasil foi aparelhada por quem ameaçava fechá-la”:

 

A bola rolava pelas Eliminatórias da Copa quando o locutor parou de narrar o jogo para mandar um “abraço especial” ao presidente Jair Bolsonaro. Aconteceu duas vezes na terça-feira, durante a transmissão de Brasil x Peru. Foi mais um lance do aparelhamento da TV Brasil pelo governo que ameaçava fechá-la.

 

Na campanha de 2018, o capitão disse que não investiria mais dinheiro num canal com “traço de audiência”. Acrescentou que pretendia privatizar ou extinguir a Empresa Brasil de Comunicação, que controla a emissora. Em pouco tempo no poder, ele abandonou a ideia. Percebeu que poderia usar a rede de comunicação pública para empregar amigos e fazer promoção pessoal.

 

No mês passado, servidores da EBC produziram um dossiê sobre o uso político da estatal. Contabilizaram 138 episódios de censura e governismo desde a posse de Bolsonaro. O retorno da fome, o desmatamento na Amazônia e os cortes na educação deixaram de aparecer na telinha. As palavras “golpe” e “ditadura” foram proibidas em reportagens que citavam o regime militar.

 

A EBC mantinha dois canais de tevê: a NBR, que divulgava os atos do governo, e a TV Brasil, que sucedeu a antiga TV Educativa. A pretexto de economizar, o Planalto fundiu as duas programações. A medida produziu situações bizarras. Programas de entrevistas e até desenhos animados passaram a ser interrompidos para transmitir solenidades oficiais e discursos do presidente.

 

O Repórter Brasil, exibido em horário nobre, ganhou cara de telejornal da Coreia do Norte. Só dá notícia a favor do governo. Recentemente, reproduziu entrevistas de autoridades à “Voz do Brasil”, símbolo do jornalismo chapa-branca.

 

Quando a TV Brasil foi ao ar, aliados de Bolsonaro fizeram discursos indignados. Onyx Lorenzoni, atual ministro da Cidadania, protestou quatro vezes na tribuna da Câmara. “Para a TV do Lula tem dinheiro, mas para a saúde, não”, disse, em outubro de 2007. “Que necessidade há de o Brasil criar uma TV para dar proteção, fazer ode e jogar confete e incenso no presidente da República?”, emendou, em fevereiro de 2008. A emissora foi muito criticada na era petista, mas não há registros de nada parecido com o que se vê agora.

 

O jornalista Eugênio Bucci, professor da USP e ex-presidente da extinta Radiobrás, diz que nunca acreditou nas ameaças do capitão de fechar a TV. “Bolsonaro é um efeito da propaganda. Não fazia sentido que, ao chegar ao poder, ele jogasse fora a EBC”, observa. “Agora acabou qualquer veleidade de se fazer uma emissora pública e plural. A TV Brasil virou um aparelhão para uso partidário e culto à personalidade”.

 

A lei que criou a EBC afirma que “é vedada qualquer forma de proselitismo na programação das emissoras públicas”. Antes do abraço no jogo da seleção, a TV Brasil já havia transmitido ao menos quatro eventos evangélicos com a presença de Bolsonaro. O último, um culto da Assembleia de Deus, ficou duas horas no ar. Nele, o presidente prometeu indicar um pastor para a próxima vaga no Supremo Tribunal Federal. “Isso não é mérito meu, é a mão de Deus”, discursou”.

 

Ouça o comentário de Anderson Gomes:

 

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