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O Senado deu início ontem a uma importante página da história do país. A Comissão Parlamentar de Inquérito que vai apontar as responsabilidades sobre a tragédia da pandemia no país foi instalada, com a escolha, como já era esperado, de Omar Aziz (PSD-AM) para presidir os trabalhos e Renan Calheiros (MDB-AL) como relator, ainda que um juiz do Distrito Federal aliado ao Palácio do Planalto tenha tentado barrar a indicação do emedebista, algo que é atribuição exclusiva da Casa Legislativa.
Eu queria aproveitar para ler nesse espaço editorial a coluna do jornalista Leonardo Sakamoto, publicada ontem pelo site UOL, onde ele fala a respeito justamente dessa comissão e da tentativa do bolsonarismo em livrar o presidente da República de responsabilização pelo genocídio que está colocado com a Covid-19. O título do texto é “Com minoria na CPI, Bolsonaro contará com apoio da máquina de ódio on-line”:
“A CPI da Pandemia começa, nesta terça (27), com o governo contando com apenas quatro dos 11 senadores que vão analisar suas ações e omissões no combate à covid-19. Em minoria no espaço institucional, Bolsonaro vai levar a guerra às redes sociais através de milícias digitais a fim de disseminar seus “fatos alternativos”.
É o que indica o comportamento da máquina de desinformação e de ódio a serviço do presidente, que já estão no modo CPI. O objetivo é tentar desmoralizar qualquer indício de irregularidade contra o governo federal e, ao mesmo tempo, empurrar as investigações para o colo de governadores, compensando a minoria na comissão.
Mesmo os parlamentares da oposição mais otimistas não apostam que a CPI possa levar à cassação de Bolsonaro, apesar de farto material para subsidiar um impeachment. O centrão continua dando sustentação ao governo, escorando-se na justificativa de que cerca de 30% da população não o abandonou.
Bolsonaro precisa que isso continue como está. Para não ter sobressaltos na conclusão de seu mandato e a fim de garantir maiores chances de reeleição em 2022.
Para tanto, as listas de WhatsApp e o grupos de Facebook que garantem suporte ao presidente, e já distribuíam material contra a CPI da Pandemia nas últimas semanas, estão em produção nesta terça.
Compartilham memes e mensagens afirmando que Bolsonaro vai começar uma importante batalha de seu mandato e que ele precisa, mais do que nunca, da ajuda dos “patriotas” para combater mentiras.
Ataques a adversários, como o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), propositor da CPI e seu vice-presidente, bem como ao senador Renan Calheiros (MDB-AL), apontado como futuro relator, também circulam nas listas e grupos.
Isso contradiz a falsa calma que o próprio presidente quis transmitir, ao afirmar, nesta segunda (26), que não está preocupado com as investigações, “porque não devemos nada”.
Senadores de oposição ou independentes que tocarem em temas sensíveis ao governo devem se tornar alvo de ataques e ameaças, bem como depoentes. Um dos alvos preferenciais deve ser o ex-ministro da Saúde e presidenciável, Luiz Henrique Mandetta, reciclando os ataques contra ele nas redes bolsonaristas nos últimos tempos.
Vale lembrar que o poder dessa CPI é menos o relatório final e mais o impacto causado na sociedade por suas revelações ao longo do processo.
Por isso, o foco das redes bolsonaristas será garantir que a parcela da população que continua apoiando o presidente não acredite nos depoimentos e documentos que vierem à tona, principalmente aqueles que demonstrem ações deliberadas do governo de ampliar o contágio da população em nome da imunidade de rebanho.
O governo tem cerca de 16% de seguidores chamados de bolsonaristas-raiz, que pulam no penhasco se o presidente mandar, segundo institutos de pesquisa. Contudo, há algo entre 10% e 14% que não acreditam em tudo o que ele diz e que, apesar de resistentes no apoio, podem mudar de opinião. Principalmente se for comprovada corrupção.
Um dos temas que deve ser avaliado pela CPI é a questão de distribuição de cloroquina, produto comprovadamente ineficaz para combater a covid-19, mas que foi promovido a elixir mágico por Bolsonaro. Recai sobre sua produção e compra suspeitas de superfaturamento. Mostrar que houve desvio de dinheiro para algo inútil pode retirar apoio desse grupo.
E isso precisa ser evitado pelas milícias do presidente. Podemos esperar, portanto, um festival de ataques ad hominem, ou seja, voltado a quem fala e não ao conteúdo que a pessoa traz.
O modus operandi não é novo, foi adotado na campanha eleitoral de 2018 e é repetido todas as vezes em que Bolsonaro precisa de apoio. Para quem achava que o jogo sujo só recomeçaria em 2022, a CPI deve ser um test drive do que será o ambiente digital tóxico no ano que vem”.
Ouça o comentário de Anderson Gomes: