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A divulgação daquele áudio ontem (15) atribuído ao cantor e ex-deputado Sérgio Reis, que diz ter se reunido com o presidente Jair Bolsonaro, ministros e militares para articular um cerco a Brasília no 7 de setembro, com intimação do Congresso pela aprovação do voto impresso e do impeachment dos ministros do Supremo, sob a ameaça de um golpe caso essas demandas não sejam atendidas, tudo isso mostra bem o caráter criminoso e golpista do bolsonarismo, que teve na sexta-feira um dos seus representantes preso, o presidente do PTB Roberto Jefferson, pelos seguidos ataques seus à democracia.
Nós debateremos muito esses temas aqui no programa ao longo da semana, mas eu gostaria de dedicar esse espaço editorial a um tema que pouco se discutiu no país, mas que é de enorme importância, e foi abordado pelo jornalista Bernardo Mello Franco na sua coluna para o jornal O Globo desse último domingo, que tem o título ‘Palácio Capanema à venda: um símbolo do desmonte da cultura”:
“O governo incluiu o Palácio Gustavo Capanema, uma joia do centro do Rio, no “feirão de imóveis” anunciado para o fim do mês. O edifício é um marco da arquitetura moderna e um patrimônio da cultura brasileira. Nos últimos sete anos, a União investiu R$ 100 milhões para restaurá-lo. Agora o ministro Paulo Guedes quer vendê-lo para engordar o caixa às vésperas da eleição.
A sede do antigo Ministério da Educação e Saúde nasceu do traço do franco-suíço Le Corbusier, que visitou o país em 1936. O croqui reunia os principais elementos de sua arquitetura: construção sobre pilotis, terraço-jardim, janelas em fita.
O projeto foi desenvolvido por uma equipe integrada por Oscar Niemeyer e Affonso Eduardo Reidy. Os azulejos de Candido Portinari, as esculturas de Bruno Giorgi e os jardins de Burle Marx transformariam o edifício num museu a céu aberto, inaugurado por Getúlio Vargas em 1945.
Hoje o edifício de 16 andares abriga uma biblioteca pública, uma sala de espetáculos, parte do acervo da Biblioteca Nacional e as superintendências de órgãos culturais.
‘Quando me disseram que o palácio seria vendido, pensei que fosse piada. É como se Roma resolvesse vender o Coliseu’, compara o arquiteto e antropólogo Lauro Cavalcanti, diretor da Casa Roberto Marinho.
A notícia do leilão, publicada pelo Valor Econômico, também provocou calafrios no poeta Armando Freitas Filho. O autor de ‘3×4’ bateu ponto no Capanema por mais de duas décadas. Dividiu seus elevadores com Carlos Drummond de Andrade, Lucio Costa e Ferreira Gullar.
‘É mais um crime dessa gente que tomou conta do Brasil. Minha vontade é responder com palavrões. Talvez eles só entendam assim’, desabafa o poeta.
O Ministério da Economia incluiu o Capanema numa lista de 2.263 imóveis a serem vendidos no Rio. ‘Vamos convidar incorporadoras, fundos imobiliários e investidores em geral’, animou-se o secretário especial de Desestatização, Diego Mac Cord.
‘Este governo é incapaz de compreender a importância histórica e arquitetônica de um edifício. No universo deles, tudo é dinheiro e mercadoria’, protesta Juca Ferreira, ministro da Cultura nos governos Lula e Dilma.
‘Só um governo demolidor da cultura poderia ter uma ideia assim’, concorda Marcelo Calero, que comandou o ministério na gestão Temer. O deputado estuda medidas judiciais para barrar o negócio. Um decreto-lei de 1937, ano em que o palácio foi erguido, impede a alienação de imóveis tombados que pertençam à União.
Para Lauro Cavalcanti, o leilão do Capanema agravaria o esvaziamento do Rio, iniciado com a transferência da capital para Brasília. 1O prédio é uma atração turística internacional. Não se trata de nostalgia, e sim de valorizar o que a cidade tem de melhor1, defende. Ele define a possível venda como uma ‘estupidez cultural’, que ilustra ‘o descalabro que estamos vivendo no Brasil1.
No dia em que tomou posse, Jair Bolsonaro extinguiu o Ministério da Cultura. Foi o ato inaugural de uma série de boicotes ao setor. O governo perseguiu artistas, asfixiou a produção de filmes e abandonou órgãos como a Cinemateca Brasileira. Vender o Capanema num ‘feirão de imóveis’ seria o símbolo final do desmonte”.
Ouça o comentário de Anderson Gomes: