Preencha os campos abaixo para submeter seu pedido de música:
Desmatamento florestal, extinção de espécies animais e vegetais, poluição de aquíferos, aquecimento global. O descaso com o meio ambiente no mundo tem muitas faces e apenas um resultado: a piora constante das condições de vida das espécies no planeta.
Para tentar entender o panorama e buscar soluções à escalada de crimes contra a natureza especialmente no Brasil, o programa Faixa Livre convidou o professor de Direito Ambiental e analista do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) Rogério Rocco, o ambientalista Sérgio Ricardo e o jornalista e mestre em Engenharia Ambiental Emanuel Alencar.
A legislação ambiental no Brasil começou a ganhar forma no final dos ‘anos de chumbo’, influenciada por um processo internacional iniciado pela Conferência de Estcolmo, em 1972, considerada referência após a ocorrência de acidentes naturais no mundo.
“É importante perceber que a política ambiental brasileira tem um momento no qual se estabelece e cresce com muito vigor, nos anos 1980, com a aprovação da lei que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente, em 1981, a criação de estruturas importantes, a Constituição de 1988 como um marco no qual a questão a ambiental ganhou maior relevância, a criação do Ibama, em 1989, que passou a reunir uma série de competências”, pontuou Rogério.
No entanto, o cenário vem regredindo ao longo do tempo, com o crescimento das demandas do capital financeiro espelhadas pelos empresários do latifúndio, que privilegiaram a produção em detrimento à saúde da população, de acordo com Sérgio Ricardo:
“Ao mesmo tempo em que houve uma melhoria da economia do país na última década, o que impulsionou esse processo foi a expansão do agronegócio. E aí acho importante lembrar que nosso país é o maior consumidor de agrotóxicos no mundo, que são venenos químicos, muitos desses proibidos em outros países há 30 anos. Além disso, esse crescimento se deu sob a expansão da pecuária, em especial sobre Amazônia. Outros biomas como o cerrado, a caatinga, têm sido bastante afetados nesse processo”.
A ascensão de Jair Bolsonaro à presidência da República acendeu o sinal de alerta entre os defensores do ecossistema no país. Após a ameaça de extinção do Ministério do Meio Ambiente, que acabou não se concretizando, o ex-capitão do Exército iniciou um desmonte das políticas públicas de proteção aos recursos naturais.
“Durante toda campanha, a questão ambiental foi pautada por Bolsonaro como algo que ele atacaria. Direcionou críticas a organizações da sociedade civil, a movimentos ambientalistas, classificou órgãos ambientais como indústrias de multas, ressaltou hipotéticos prejuízos que o controle ambiental traria ao agronegócio”, destacou o analista ambiental.
“A declaração do Bolsonaro sobre o acordo de Paris tem tanta sustentação como uma estaca fincada no pântano. Me parece que temos de esperar a poeira assentar para ver o que vai sobrar desses discursos bravateiros” – Emanuel Alencar
“Especificamente, desde o momento em que foi multado pelo Ibama por exercício de pesca ilegal numa unidade de conservação federal, Bolsonaro passou a ter, no exercício do seu mandato como parlamentar, uma ação incisiva contra a fiscalização ambiental. Apresentou um projeto para desarmar os fiscais do Ibama e do ICMBio, ele que defende que a população se arme”, continuou o professor.
O atual presidente foi autuado em janeiro de 2012 na Estação Ecológica de Tamoios, entre os municípios de Angra dos Reis e Paraty, no Rio de Janeiro. À ocasião, Bolsonaro se recusou a atender as solicitações dos fiscais do Ibama e chegou a telefonar para o ministro da Pesca, Luiz Sérgio Nóbrega, informando o ocorrido e exigindo providências.
Na última quarta-feira, a Advocacia-Geral da União avaliou que o ex-deputado teve seu amplo direito de defesa violado e obrigou o Instituto do Meio Ambiente a anular a multa de R$ 10 mil aplicada. O processo terá de passar por novo julgamento.
No Planalto, apesar de não extinguir o Ministério do Meio Ambiente, Jair Bolsonaro nomeou como titular para a cadeira da Agricultura a deputada Tereza Cristina, ligada ao agronegócio e conhecida como ‘musa do veneno’ em Brasília.
Além disso, algumas atribuições da pasta comandada por Ricardo Salles foram repassadas a outros ministérios, como é o caso da Agência Nacional de Águas, que coordena a política nacional de recursos hídricos, transferida ao Desenvolvimento Regional, e o Sistema Florestal Brasileiro, agora sob responsabilidade do Ministério da Agricultura.
“Estamos vivenciando na prática um crescimento da força política da bancada ruralista. O país nunca enfrentou a questão da reforma agrária, vemos uma subordinação das políticas ambientais ao interesse do agronegócio. A escolha desse ministro do Meio Ambiente, a própria escolha do Ministro das Relações Exteriores também vem nesse contexto, um momento em que o novo governo de extrema direita-passa a atacar organismos internacionais”, afirmou Sérgio Ricardo.
Outra iniciativa implementada por Jair Bolsonaro diz respeito à mudança de atribuição da demarcação de áreas indígenas da Funai para o Ministério da Agricultura, o que pode acelerar o processo de desmatamento da Amazônia em benefício dos ruralistas.
“O governo de extrema-direita já definiu quais são seus alvos, ficou claro que as populações indígenas serão fortemente atacadas em função dessa subordinação da política indigenista” – Sérgio Ricardo
Autor do livro ‘Baía de Guanabara: descaso e resistência’, financiado pelo Partido Verde alemão quando das Olimpíadas do Rio de Janeiro e que traça um panorama da situação da enseada, Emanuel Alencar lembrou a situação de descaso das autoridades com a região no estado fluminense.
“Até hoje a Baía de Guanabara sofre com uma degradação absurda, 18 mil litros de esgoto são despejados por segundo com tratamentos pífios, há estações de tratamento que jamais receberam um mísero litro de esgoto para tratar. Parece-me claro hoje, estudando o que aconteceu, onde estamos e queremos seguir, que os erros cometidos lá pelo PDBG, em 1994, 1995, continuam sendo cometidos nos programas atuais”, ratificou.
O jornalista se refere ao Programa de Despoluição da Baía de Guanabara (PDBG), o primeiro grande projeto neste sentido, concebido na gestão do governador Leonel Brizola e com execução de recursos durante o governo de Marcelo Alencar.
“É assustador verificar que o PSAN, que é o programa de saneamento dos municípios no entorno da Baía de Guanabara, assinado em 2012, ainda não foi concluído e padece de morosidade nas obras. Há uma falta de transparência muito grande na aplicação desses recursos, a sociedade não consegue acompanhar com precisão como está a marcha dessas intervenções”, lamentou o mestre em Engenharia Ambiental.
“A sociedade, em sua maioria, quer saber de dinheiro no bolso. Se tiver estabilidade econômica, dane-se o meio ambiente, a Amazônia, o planeta. Em um cenário desse, vejo como caminhos um insucesso econômico, um meteoro ou uma invasão alienígena. Por consciência, estamos perdidos” – Rogério Rocco
“O tronco coletor da Cidade Nova, que seria muito importante para coletar o esgoto dos bairros da região central do Rio, na ocasião o Índio da Costa era o Secretário Estadual do Ambiente e anunciou que a obra acabaria a tempo dos Jogos Olímpicos. Até hoje não terminou”, seguiu.
O saneamento básico é um dos principais problemas da administração pública no país. De acordo com estudo do Instituto Tarta Brasil, em 2016, apenas 44,9% do esgoto era tratado, o que significa que mais da metade dos efluentes orgânicos são despejados diretamente na natureza.
Em seus últimos dias no Planalto, Michel Temer publicou a Medida Provisória 868/2018, que trata sobre o Marco Regulatório do saneamento. Conforme a leitura de alguns setores da sociedade civil, o projeto pode causar um desequilíbrio ainda maior na questão relativa à distribuição de água e coleta de esgoto no país.
A medida priorizaria os municípios superavitários, que são minoria absoluta entre as 5 mil cidades brasileiras, acabando com o subsídio cruzado, ou seja, as famílias quem têm condições de pagar uma tarifa de água e esgoto acabam ajudando aquelas que não têm.
“Isso feito por Medida Provisória não é a melhor forma, primeiro porque você não discute com a sociedade o melhor modelo para avançar no saneamento. Depois a questão fica muito nublada, dentro de caixinhas, de decisões tomadas à toque de caixa para beneficiar alguns grupos econômicos interessados no saneamento. Isso posto, acredito que só os governos não serão capazes sozinhos de resolver a questão, precisamos contar com a iniciativa privada, mas, evidentemente, desde que essa questão seja discutida a sério e haja a regulação dos serviços”, avisou Emanuel.
Ouça o debate na íntegra pelo link abaixo:
Debate em 11.01.2019