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Debate: 50 anos do AI-5

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O ano de 1968 é conhecido popularmente em todo mundo como aquele que ‘não acabou’. No Brasil, ele acabou sim, com as liberdades individuais, o direito de protesto, as garantias constitucionais, com o resquício mínimo de democracia que ainda poderia existir desde a tomada do poder pelos militares. Este movimento se deu com a decretação do Ato Institucional nº 5, o AI-5, que completa 50 anos no próximo dia 13.

 

Para debater os fatos sombrios que o sucederam, o programa Faixa Livre convidou o professor de Ciência Política da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Charles Pessanha, o militante do Partido Comunista Brasileiro (PCB) Ivan Pinheiro e o professor de História da UFRJ Francisco Carlos Teixeira.

 

O Ato Institucional foi um instrumento de força baixado pelo Executivo que vigorava ao lado da Constituição com poder, inclusive, para suspendê-la. Sua edição pelos comandantes das Forças Armadas ou pelo presidente da República estava respaldada pelo Conselho de Segurança Nacional e alcançou seu ápice no ano que não acabou.

Charles Pessanha

Charles Pessanha

 

“Precisamos ter em vista que o ano de 1968 era de recusa a 1964. Se em 1964 os golpistas tinham conseguido de forma mais ou menos clara algum apoio popular ao golpe, esse respaldo tinha todo evaporado em 1968. Tínhamos constituído a frente ampla para enfrentar os militares e os segmentos golpistas, a população estava nas ruas, os estudantes mobilizados, as greves operárias eram massivas, os movimentos dos funcionários públicos de rejeição, a sociedade estava mobilizada e articulada contra as políticas econômicas e de arrocho que vinham sendo praticadas pelo programa liberal da ditadura”, destacou Francisco Carlos.

 

Estabelecido na chegada dos militares ao Planalto, o primeiro Ato Institucional sequer foi numerado, pois a expectativa era a de que vigorasse por seis meses com eleições no ano seguinte. Entretanto, o que se viu foi o recrudescimento das ações repressivas.

 

“O Ato institucional não previa revisão judicial, não era cabível ser apreciado por nenhum tribunal do país, nem pelo parlamento, era absoluto, isso marca uma ditadura. A fonte dele era o chamado o comando revolucionário”, lembrou o professor de História.

 

“Qualquer golpe dentro do capitalismo é a favor do capital. Quando a classe trabalhadora entra em cena, muda o panorama” – Ivan Pinheiro

 

Com boa parte da sociedade contrária ao regime imposto, as Forças Armadas utilizaram como argumento definitivo para instituir o 5º e mais restritivo ato o pronunciamento do deputado Márcio Moreira Alves (MDB), conhecido como ‘Marcito’, lançando um apelo para que o povo não participasse dos desfiles militares do 7 de Setembro e para que as mulheres, ‘ardentes de liberdade’, se recusassem a sair com oficiais.

 

“O Marcito fez uma brincadeira dizendo que as moças não deveriam casar com os cadetes. Aquilo foi em setembro e levado até dezembro porque era um pretexto, não era uma causa. A causa era a formação de uma frente de sociedade civil. Foi a primeira vez desde 1964 que havia um complexo. A OAB estava fazendo suas primeiras reuniões e havia uma formação de antigos inimigos como [Carlos] Lacerda e Juscelino [Kubitscheck], no pacto de Lisboa, Lacerda e Jango [João Goulart], no pacto de Montevidéu, para montar a Frente Ampla”, pontuou Pessanha, liderança estudantil à época e uma das vítimas do regime, preso entre os anos de 1969 e 1970.

 

Outro que esteve nos porões da ditadura foi Ivan Pinheiro. Estudante de direito quando do AI-5 e membro do Movimento Revolucionário 8 de outubro (MR-8), o militante do PCB ressaltou que a resistência aos regimes ditatoriais se estendeu pelos países vizinhos ao Brasil, com uma falha.

 

Francisco Carlos Teixeira

Francisco Carlos Teixeira

“A partir de 1968, começa a surgir a luta armada na América Latina quase toda, mas teve o erro do ‘foquismo’ em si, de achar que um punhado de militantes levaria as massas. No Brasil, começam a surgir algumas guerrilhas, houve um episódio que alavancou o movimento até a passeata dos 100 mil, que foi o assassinato do Edson Luiz”, comentou, referindo-se à morte do estudante por policiais militares durante confronto em um restaurante.

 

Dentre as cassações impostas pelo Ato Institucional nº 5 destacam-se a decretação do recesso do Congresso Nacional, a intervenção em estados e municípios, a cassação de mandatos parlamentares, a suspensão, por dez anos, dos direitos políticos de qualquer cidadão e da garantia do habeas corpus.

 

“O AI-5 abriu uma porta para todo tipo de arbitrariedade, vimos a cassação de mandatos parlamentares, juízes do Supremo, cassaram um juiz do Superior Tribunal Militar sob a alegação de que ele dava muito habeas corpus, em seguida suspendem o habeas corpus. Se estabeleceu a prisão sem mandado, sem acusação, por 60 dias, sendo dez deles incomunicáveis sem saber onde a pessoa estava. Significava dez dias de tortura. Viver sob o AI-5 era viver sob tensão e medo constantes em todos os sentidos”, comentou Francisco Carlos.

 

“A contrariedade ao Supremo é o único ponto de convergência entre os diversos grupos de pressão em torno de Bolsonaro” – Charles Pessanha

 

Foram instituídos 17 atos institucionais ao todo, sendo cinco deles entre fevereiro e agosto de 1969. “O AI-5 fechou o Congresso por praticamente um ano praticamente, o que funcionava eram os atos”, rememorou Pessanha. As casas legislativas seriam reabertas em outubro de 1969 para referendar a escolha do general Emílio Garrastazu Médici para a presidência.

 

“Como em todo regime autoritário, você tem um clima de universalização da suspeita e pode ser condenado por um crime pretérito. O AI-2, por exemplo, aumentou o número de ministros do Supremo para garantir maioria ao regime, e depois aposentou três”, continuou o professor de Ciência Política.

 

Os ataques à democracia determinados pelos militares foram alvo de comparação pelos integrantes da mesa ao momento que o Brasil atravessa. Francisco Carlos avaliou que as declarações de Jair Bolsonaro indicam um clima de instabilidade aos poderes:

 

“Uma coisa que devemos chamar atenção são as inúmeras pistas hoje colocadas pelo governo que vai tomar posse falando sobre uma reforma do Supremo, aumentando inclusive o número de juízes do STF. Temos o enraizamento do regime autoritário dando um poder enorme ao governo, relembra bem a tática do regime militar”.

 

Vale destacar que o presidente do Supremo Tribunal Federal Dias Toffoli nomeou como seu assessor especial o general da reserva do Exército Fernando Azevedo e Silva, que dias depois viria a ser escolhido pelo presidente eleito para ocupar o Ministério da Defesa.

 

A atuação da mais alta Corte do país também foi alvo de críticas de Charles Pessanha, que ainda assim reconheceu algumas conquistas referendadas pelos magistrados.

Ivan Pinheiro

Ivan Pinheiro

 

“Tudo que Bolsonaro fala é balão de ensaio para ver até onde ele pode ir” – Francisco Carlos Teixeira

 

“Apesar de o STF ter votado por unanimidade a aprovação da união homoafetiva e as cotas, pecou muito em questões dúbias, e isso o enfraqueceu. Tem de se cobrar dos órgãos republicanos uma ação mais efetiva”, avaliou. O professor fez questão de destacar um dos erros cometidos pelas gestões petistas.

 

“O Ministério Público foi um pouco desvirtuado no governo Lula. Sempre fui contra a nomeação do Procurador-Geral da República via eleição sindical. Não é previsto na Constituição e transferiu-se o poder que era do presidente para essa assembleia de procuradores, não há lista tríplice para escolha do procurador”, lembrou.

 

Pessanha teve o discurso corroborado por Ivan Pinheiro. O militante comunista avaliou que a eleição do próximo presidente tem influência definitiva das escolhas tomadas pelo Partido dos Trabalhadores.

 

“Lamentavelmente a lei antiterrorismo foi editada no governo Dilma. O PT tem muita responsabilidade sobre esse governo neofascista. A única coisa que temos em comum com a ditadura é que os dois momentos fazem parte de processos de golpes continuados. Essa eleição é a continuação de um golpe, que começou com impeachment de Dilma e continuou com a prisão de Lula”, encerrou.

 

Ouça na íntegra o debate abaixo:

 

 

Debate em 07.12.2018

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