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O desmonte do Estado brasileiro patrocinado pelo entreguismo do grande capital põe em risco uma série de conquistas históricas do povo, e não apenas direitos, como também patrimônios nacionais. A principal ameaça da irresponsabilidade e falta de visão do governo Bolsonaro se dá à Petrobras.
A estatal de petróleo passa por um processo gradual de privatização com a venda de refinarias, subsidiárias e gasodutos, sem contar os leilões das reservas do pré-sal, que desmonta seu caráter estratégico para a economia do país.
Para discutir os rumos da companhia, o Faixa Livre convidou o vice-diretor de comunicação da Associação de Engenheiros da Petrobras (Aepet) e diretor da Petros Fernando Siqueira, o diretor do Clube de Engenharia e geofísico da área de exploração de petróleo Marco Latge e o coordenador-geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP) José Maria Rangel.
O quadro de desmantelamento da companhia, iniciado em gestões anteriores, começa a se intensificar durante o governo de Dilma Rousseff no Palácio do Planalto, quando Aldemir Bendine assumiu a presidência da Petrobras após a renúncia de Graça Foster, motivada pelos escândalos revelados pela Operação Lava Jato.
“É muito complexo a gente conseguir entender o que está acontecendo. Quando a Petrobras parece que está livre para crescer, leva um tiro e novamente começa a ser abatida. Você vê uma empresa que sempre operou com muitas dificuldades de recursos de caixa justamente numa atividade de exploração e refino. A Petrobras conseguiu, com seu planejamento estratégico, se tornar uma empresa integrada na cadeia completa, do poço ao posto, como todas as grandes do mundo. Esse é um momento de equívoco, a empresa devia crescer na sua integração, e não vender refinarias”, indicou Latge.
Após a descoberta do pré-sal, em 2006, quando Lula ainda era presidente, a estatal passou a contar com uma das maiores reservas de óleo bruto do mundo, o que despertou o interesse de corporações estrangeiras e a cobiça de líderes das principais potências globais, em especial os Estados Unidos.
“Esse momento de entrega do patrimônio público pelo qual a Petrobras passa foi muito bem arquitetado pelo golpe jurídico, midiático e parlamentar que foi dado no país” – José Maria Rangel
“Infelizmente o governo Dilma, em 2013, leiloou o Campo de Libra, que é um dos maiores do pré-sal. Ela sofreu pressão direta do [ex-presidente dos EUA] Barack Obama e do [vice] Joe Biden, que veio ao Brasil falar com ela e com a Graça Foster. Um mês depois a Dilma fez o leilão de Libra, que foi muito ruim para o Brasil porque o governo ficou com menos de 40% do campo que era um dos maiores do pré-sal”, comentou o dirigente da Aepet.
Atualmente os norte-americanos detém uma reserva estimada em 30 bilhões de barris, mas consomem cerca de um terço desse estoque anualmente. O interesse dos estadunidenses no óleo mineral é tamanho que tem motivado a intervenção nos países com os maiores acúmulos, em alguns casos provocando conflitos armados, como no Iraque, Líbia e Irã.
“A tentativa de golpe na Venezuela capitaneada pelos Estados Unidos não é muito difícil de entender. Os Estados Unidos não têm interesse no povo da Venezuela, eles estão preocupados porque lá tem petróleo”, comentou José Maria Rangel em relação aos recentes episódios de violação da ordem democrática no país vizinho.
Com a promulgação da chamada Lei do petróleo, em 2010, onde se definiu a partilha do pré-sal e o projeto de capitalização da empresa, o Governo Federal conseguiu elevar seu percentual de participação na petrolífera, adquirindo ações com o dinheiro resultante da compra de conjuntos de blocos das reservas de óleo em águas profundas.
“Não existe mais um corporativismo na Petrobras, ao contrário, a empresa se dividiu. Hoje está cada um em um espaço, ninguém se fala, está cheio de segurança, você não pode visitar um colega em outra sala” – Marco Latge
Entretanto, os ‘problemas’ se deram após o início das perfurações na bacia de Santos, quando se descobriu uma reserva muito superior aos 5 bilhões de barris estimados.
“Está com um excedente de 17,2 bilhões de barris. É uma reserva fantástica que o governo quer vender. O Bolsonaro, que no passado tinha uma posição nacionalista, agora está adotando uma postura absolutamente entreguista nomeando Paulo Guedes, que é um neoliberal cuja formação profissional foi no Chile de Pinochet”, salientou Siqueira.
A atual administração da Petrobras, a cargo do economista Roberto Castelo Branco, começa a colocar em ação o chamado programa de desinvestimento. Nos últimos dias, os gestores anunciaram a privatização dos gasodutos das regiões Norte e Nordeste.
A Transportadora Associada de Gás (TAG), subsidiária da estatal e dona da malha que transporta o gás natural, foi privatizada sem licitação, decisão que vai de encontro a uma determinação do Supremo Tribunal Federal.
“Vamos tentar barrar a venda da TAG na Justiça, eles atropelaram a liminar do [ministro Ricardo] Lewandowski. A TAG está dando um lucro de US$ 7 bilhões por ano e foi vendida por US$ 8 bilhões. É um entreguismo absurdo, um crime de lesa-pátria destas direções malfadadas”, ressaltou o diretor da Petros. Ele se refere ao parecer que exige à estatal prévia licitação para que se desfaça de ativos.
Além disso, ficou definida a venda de oito refinarias de controle da Petrobras, ou seja, a totalidade das que não estão nos territórios de Rio de Janeiro e São Paulo. São elas a de Abreu e Lima (RNEST), em Pernambuco, a Unidade de Industrialização do Xisto (SIX), no Paraná, a Landulpho Alves (RLAM), na Bahia, a Gabriel Passos (REGAP), em Minas Gerais, a Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR), no Paraná, a Alberto Pasqualini (REFAP), no Rio Grande do Sul, a Refinaria Isaac Sabbá (REMAN), no Amazonas, e a Lubrificantes e Derivados de Petróleo do Nordeste (LUBNOR), no Ceará.
“A NTS, Nova Transportadora do Sudeste, foi vendida por um preço irrisório que deu para pagar apenas 18 meses do aluguel que a Petrobras vai fazer dela. A Petrobras vende para depois alugar porque é ela que usa” – Fernando Siqueira
Tais medidas, somadas à venda da BR Distribuidora, colocam o Brasil na dependência do capital estrangeiro para produção e transporte do petróleo, algo inimaginável até poucos anos atrás.
“Há o desmonte de toda uma cadeia de óleo e gás que foi construída de 2003 para cá e que obviamente colocava a Petrobras como a mola indutora do desenvolvimento nacional. A Petrobras hoje já opera como se fosse uma empresa privada no setor de refino e distribuição. O resultado disso é que temos uma inflação de 7% desde que mudou a política de realinhamento dos derivados e um reajuste de mais de 50% no diesel e na gasolina, e 33% no botijão de gás”, destacou o diretor da FUP.
A política de preços da estatal, aliás, tem provocado polêmica dentro do próprio Governo Federal. O presidente Jair Bolsonaro recentemente interveio e barrou um aumento no preço do óleo diesel, decisão que acabou sendo revogada uma semana depois a pedido da equipe econômica.
“São coisas que estão sendo decididas em níveis que não eram para ser dessa forma. Parece que é uma brincadeira porque tudo que deve ser feito, não é feito. O planejamento estratégico muda a cada dois anos, uma hora vende todos os ativos, daqui a pouco você integra. É um grande erro o que está acontecendo. Esse programa de desinvestimento está sendo muito danoso para a empresa”, lamentou Latge.
O argumento de que ‘os governos do PT destruíram a Petrobras’ não convence José Maria Rangel. Ele coloca como uma das culpadas para a derrocada da estatal a operação anticorrupção que teve o ex-juiz Sergio Moro, atual ministro da Justiça, como principal símbolo.
“Quando você olha o balanço da Petrobras, eles colocam em letras garrafais que recuperaram R$ 3 bilhões dos desvios da companhia. No entanto, a empresa já pagou mais de R$ 20 bilhões aos fundos avulsos, à Justiça norte-americana, e tem mais um monte de ações na Holanda. A Lava Jato virou hoje um grande negócio para as pessoas sangrarem a Petrobras e é o que estão fazendo. Ou vamos para a sociedade fazer esse discurso, com um certo atraso, ou os caras vão passar o rodo como estão passando na gente”, alertou.
Ouça o debate na íntegra:
Debate em 03.05.2019