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Debates especiais fim de ano: Rio de Janeiro

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A crise que afeta o país em todas as suas formas atingiu em cheio o Rio de Janeiro, potencializada pela chegada ao poder de uma organização criminosa chefiada pelo ex-governador Sérgio Cabral e o MDB. Mas a corrupção dos entes públicos é a única motivação para o caos social que vivemos no estado?

 

Na tentativa de responder essa e outras perguntas, o Faixa Livre convidou o deputado estadual Flávio Serafini (PSOL), o jornalista Henrique Acker e o professor de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Bruno Sobral em mais um debate especial de fim de ano do programa.

 

O quadro que aponta altos índices de desemprego, sensação de ausência de representatividade, crescimento constante da violência urbana e aumento das distorções sociais no estado é ocasionado por um mix de condições.

 

Flávio Serafini

Flávio Serafini

“O Rio de Janeiro vive uma convergência de crises, institucional, política, econômica, por diferentes fatores. Os dois últimos governadores, os três últimos presidentes da Assembleia Legislativa e um Procurador-Geral de Justiça estão presos. Isso mostra como a corrupção se entranhou nas diferentes instituições do estado”, destacou Serafini.

 

O deputado se refere, além de Sérgio Cabral, a Luiz Fernando Pezão, atual governador e preso recentemente pela Lava Jato, aos deputados estaduais Jorge Picciani e Paulo Melo, e ao ex-procurador Cláudio Lopes. Além deles, outros parlamentares e membros do Judiciário foram detidos e afastados de seus cargos.

 

“Esse grupo que tomou conta do poder se aproveitou de mecanismos que tiravam transparência do processo legislativo, inclusive financeiro. Um deles foi a perda de controle sobre subsídios e isenções fiscais, isso não passava mais pela Assembleia Legislativa”, continuou o político do PSOL.

 

A lei 7657/17 autoriza o estado a conceder incentivos a empresas sem a aprovação pela Alerj, desde que chancelados pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) relativos a programas já existentes, limitados a 200 milhões de Ufirs, cerca de R$ 659 milhões.

 

“Se a lógica do ‘mais Brasil e menos Brasília’ do Paulo Guedes for instrumentalizar, não resolve o problema” – Bruno Sobral

 

Apesar da legislação limitar as isenções fiscais oferecidas pelo governador, não é o que se vê na prática. O Confaz, aliás, é um dos poucos órgãos que fazem a mediação entre Governo Federal, estados e municípios.

 

“A União tirou uma parte da receita dos estados, não repartiu, e, fora isso, não criou nenhuma instância de coordenação institucional. A relação é realizada de maneira circunstancial, caso a caso. A única que existe, o Confaz, teria de impedir essa guerra fiscal. Só deveria haver isenções autorizadas pelo conselho, mas não é o que acontece. Existem as oferecidas pelo Confaz e as dadas discricionariamente pelos estados”, ressaltou Sobral.

 

Os benefícios oferecidos aos empresários que se estabelecem no Rio de Janeiro são condicionados a uma compensação social, como a geração de um número mínimo de empregos ou recolhimento de outros impostos. No entanto, o próprio poder público faz vista grossa.

 

“Em cerca de 10 anos, há uma estimativa de quase R$ 150 bilhões de incentivos fiscais com pouca ou nenhuma contrapartida ao estado, sem um setor no governo para acompanhar essas contrapartidas as quais os grupos econômicos se comprometem. A inexistência desse setor no governo mostra como nunca houve intenção de que elas fossem de fato oferecidas”, aponto Serafini.

 

Bruno Sobral

Bruno Sobral

A lógica que confunde os interesses públicos e privados no estado remonta a meados do século passado, antes do período ditatorial e da fusão do antigo estado da Guanabara ao Rio de Janeiro.

 

“Temos de localizar o Rio de Janeiro dentro da realidade brasileira. Há um histórico, até antes da ditadura, que mudou alguma coisa com o [ex-governador Leonel] Brizola, mas vemos que a política tem uma herança forte dessa forma de ser feita, do toma lá, dá cá, dessa troca de favores. As elites até hoje não apresentaram um projeto de desenvolvimento includente, que leve à distribuição de renda, ao avanço da democracia em todos os sentidos”, avaliou Acker.

 

O processo de falência financeira do estado foi acompanhado pela adesão a um Regime de Recuperação Fiscal (RRF), em setembro do ano passado, imposto pelo Governo Federal. O plano prevê a suspensão do pagamento da dívida com a União por até três anos e a aquisição de empréstimos para pagar as obrigações básicas, como salários de servidores.

 

“Devemos discutir mais a corrupção na esquerda. Se não fazemos esse debate, acabamos naturalizando alguns aspectos” – Flávio Serafini

 

Como garantia de que vai quitar o saldo devedor, o governo fluminense ofereceu a Companhia Estadual de Águas e Esgoto (Cedae), que deve ser privatizada. Após uma disputa entre Executivo e Legislativo, os deputados proibiram que a empresa fosse entregue ao capital privado, mas a Justiça revogou o impedimento na última segunda-feira (17). Por 17 votos a 5, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio derrubou a emenda aprovada pela Alerj. A situação chega a ser bizarra, visto que a União deve dinheiro à empresa estadual.

 

“Não temos dúvida que a privatização da Cedae, da maneira que foi imposta, era um plano de mais uma negociata. A Cedae dá lucratividade ao redor de R$ 400 milhões por ano. Além disso, o Supremo Tribunal Federal reconheceu que havia cobrança de imposto de renda de maneira indevida, o que dá à empresa direito a receber R$ 5 bilhões da União. A Alerj aprovou a autorização para a alienação sem discutir qual seria o modelo, o valor. Do ponto de vista econômico seria um grande prejuízo e do ponto de vista estratégico, a empresa faz a gestão das águas do estado, que é fundamental para se pensar o acesso a esse recurso”, lembrou o deputado.

 

Os créditos do Rio de Janeiro com o Governo Federal não se limitam à dívida com a companhia de águas e esgoto. A Lei Kandir, assinada pela gestão de Fernando Henrique Cardoso, confere isenção do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) a exportação de produtos primários e semimanufaturados. Todavia, este é um tributo estadual.

 

O prejuízo aos cofres do estado gira atualmente em torno de R$ 4,5 bilhões por ano. O acumulado no período passa da casa dos R$ 60 bilhões.

 

“Um problema grave é o avanço das milícias, que antes apoiava candidatos e hoje faz sua bancada, tem influência decisiva e constrói essa política no vazio deixado pela falta de projeto” – Henrique Acker

 

Henrique Acker

Henrique Acker

“Os valores são muito expressivos, mas é passado particularmente pela grande mídia que o buraco financeiro do estado seria causado pelo que o [Sérgio] Cabral roubou. É claro que tem de ser investigado, mas o problema é causado muito mais por esse vazio institucional, essa dificuldade de se ter um planejamento econômico, um modelo de desenvolvimento e saber ter barganha política com essas injustiças federativas”, ressaltou o professor de Economia da UFRJ.

 

Parte da solução para a crise passa pelo aproveitamento dos recursos naturais do Rio de Janeiro e da utilização do conteúdo acadêmico produzido pelas instituições de ensino superior do estado, na opinião de Henrique Acker.

 

“Só no turismo, podíamos arrecadar com a Baía de Guanabara, sem falar no transporte. Há potenciais que não são explorados porque entre os interesses populares e econômicos desses grupos que comandam a política no Rio há um abismo enorme”, avaliou.

 

“Somos um estado que tem quatro ou cinco universidades públicas, que nos leva à possibilidade de ter polo de desenvolvimento de tecnologia e de projetos de planejamentos da melhor qualidade. Há polos já estabelecidos de metalurgia no sul-fluminense, da área têxtil, polo petroleiro na região de Macaé, polos de turismo, mas existe uma rapinagem e uma Alerj dominada pela política tradicional”, encerrou o jornalista.

 

Ouça abaixo o debate na íntegra:

 

 

Debate em 18.12.2018

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