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Editorial – 06.09.2019

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Jair Bolsonaro ontem apresentou a sua escolha para o indicado ao futuro cargo de Procurador-Geral da República ao longo do seu mandato. O escolhido foi o Augusto Aras, ele é um Subprocurador da República e não estava na escolha que foi realizada pelos procuradores através da votação, a chamada lista tríplice. Com isso, Bolsonaro quebra uma tradição que foi inaugurada pelo presidente Lula, justamente à luz de indicações que anteriormente procuravam, através desse cargo, proteger o Executivo, é isso.

 

A experiência passada, principalmente com Fernando Henrique, mostrou que tínhamos feito a escolha diretamente pelo presidente e com cuidado para o nome escolhido não vir a causar problemas àquele de plantão. O Fernando Henrique ao escolher, por exemplo, o senhor Geraldo Brindeiro na verdade colocou no cargo alguém que, ao longo do seu mandato, foi chamado de engavetador-geral da República.

 

Tudo isso porque esse cargo é muito importante, o procurador tem a prerrogativa não só de levar à frente processos, como incriminar ministros de Estado e o próprio presidente da República. Geraldo Brindeiro cumpriu um papel muito importante na época do Fernando Henrique quando, por exemplo, se recusou a qualquer tipo de investigação mais séria a respeito da compra de votos para viabilizar a emenda da reeleição que beneficiou o próprio Fernando Henrique, bem como as inúmeras denúncias em torno de benefícios a bancos, com aquele chamado programa de ajuda ao sistema financeiro com o nome de Proer, entre outras coisas que certamente Fernando Henrique deve ao Geraldo Brindeiro.

 

Por isso foi um avanço institucional democrático quando Lula passou a escolher o futuro Procurador-Geral da República, indicá-lo para a sabatina no Senado a partir da lista tríplice, respeitando inclusive o mais votado. Agora Bolsonaro quebra essa prática e indica o senhor Augusto Aras. O senhor Augusto Aras recebeu algumas críticas de setores considerados à direita por conta especialmente de suas posições com relação à Lava Jato. Ele diz que sempre apoiou a operação não como política de governo, mas como política de Estado, mas, ao mesmo tempo, o fato é que Augusto Aras procurou criar essa sua situação privilegiada de escolhido pelo presidente da República a partir de uma ação paralela à movimentação da Associação Nacional dos Procuradores da República que organiza a votação para a escolha da chamada lista tríplice.

 

Augusto Aras trabalhou por fora, procurou se aproximar de Bolsonaro, fez declarações que agradavam o presidente, como essa, por exemplo, afirmando que Bolsonaro é um homem maduro, católico, que poderia ser enquadrado em um viés de direita, mas ao mesmo tempo dizia que como cidadão que conhece a vida, sexagenário, estudioso, professor, ele jamais poderia aceitar, por exemplo, a chamada ideologia de gênero, claramente em uma tentativa de se aproximar das posições que são conhecidas de Jair Bolsonaro contra qualquer tipo de política mais liberal em torno dessa questão do gênero.

 

Com isso, a Associação Nacional dos Procuradores da República já se manifestou ontem inclusive através de nota com críticas a esse procedimento. Para a Associação, essa decisão é um retrocesso institucional e democrático e é difícil tirar a razão da Associação Nacional dos Procuradores. O fato é que teremos de observar muito bem quais são as intenções Bolsonaro e principalmente como a própria sociedade e os procuradores irão reagir a isso.

 

Bolsonaro tem uma política explícita de intervenção junto a órgãos que podem lhe causar problemas, como, por exemplo, a Polícia Federal ou mesmo o Coaf, que ele acabou retirando do âmbito do Ministério da Economia, transferiu para o Banco Central e, com isso, procura estancar as investigações, inclusive com apoio do presidente do Supremo Tribunal Federal, investigações que podem afetar a vida do seu filho Flávio Bolsonaro e sua própria vida como político, Bolsonaro que está no cargo de presidente da República, tudo por conta daqueles malfeitos, digamos assim, tendo à frente o Fabrício Queiroz, aquele famoso ex-assessor desaparecido do Bolsonaro que organizava uma caixinha dentro do gabinete do ex-deputado estadual, hoje senador, e que ontem ganhou mais um capítulo essa sua história.

 

O Ministério Público, de acordo com o jornal O Globo possui gravações obtidas junto à Justiça onde o Fabrício Queiroz mostra preocupação com as relações do gabinete com aquele chamado Capitão Adriano, chefe do Escritório do crime aqui no Rio de Janeiro, de acordo com a polícia. Tudo isso porque a ex-mulher e a mãe do Capitão Adriano eram assessoras de Flávio Bolsonaro, e pior do que isso, eram assessoras fantasmas, não há nenhuma comprovação de que elas de fato trabalhassem no escritório.

 

É, na verdade, mais um elo que comprova a relação da família Bolsonaro com a família do Capitão Adriano. É por essas e por outras que me parece existe muita desconfiança nessa escolha do novo Procurador-Geral da República. Com essa prática última do Bolsonaro de procurar interferir nesses órgãos e agora com esse tipo de escolha para a Procuradoria-Geral da República, é necessário todo cuidado da sociedade que quer maior controle, principalmente daqueles setores, inclusive, dentre aqueles que simpatizam com Bolsonaro que acreditavam que o combate à corrupção e às irregularidades praticadas por políticos seriam uma tônica desse governo presidido por Jair Bolsonaro.

 

Qual o quê, estamos observando é um retrocesso gigantesco justamente nessas medidas que nos últimos anos foram tomadas, medidas administrativas e legais, que facilitaram inclusive a deflagração dessas operações anticorrupção. É mais uma bola fora do Bolsonaro que terá de se ver agora com os próprios procuradores. Os procuradores possuem grande independência na sua atuação e eles certamente poderão, apesar da escolha desse nome para a Procuradoria-Geral da República, causar surpresas desagradáveis ao presidente da República.

 

Ontem também o Bolsonaro acabou divulgando a lista dos vetos à chamada Lei de Abuso de Autoridade e é outra frente que ele abrirá conflitos com o Congresso, afinal de contas o Congresso também está de olho nas chamadas práticas que consubstanciam o chamado abuso de autoridade. Portanto, mais do que nunca, o terreno está minado em torno do Bolsonaro que, no entanto, continua sua ofensiva em prol dos seus interesses mais imediatos.

 

Ouça o comentário de Paulo Passarinho:

 

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