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Editorial – 08.05.2020

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Em meio a tantos ataques promovidos pela gestão federal contra os trabalhadores brasileiros nos últimos dias usando como argumento a pandemia do novo coronavírus, como a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 10 esta semana, que condiciona a ajuda financeira a estados e municípios ao congelamento do salário de servidores públicos por 18 meses, uma iniciativa grave do governo Bolsonaro passou despercebida de muita gente: a tentativa de interferência na Receita Federal, importante órgão de Estado que tem, entre suas missões, a de fiscalizar o recolhimento tributos e evitar a sonegação fiscal.

 

Para vocês entenderem a que estou me referindo, vou passar à leitura de uma nota da Delegacia Sindical do Rio de Janeiro do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal, o Sindifisco, publicada na última terça-feira. Diz a nota:

 

A diretoria da DS/Rio expressa preocupação com notícia publicada no jornal O Estado de S. Paulo e replicada em outros veículos da imprensa, como Jornal do Brasil e O Globo, de que o secretário da Receita Federal teria sido convocado pelo presidente da República e pelo deputado Federal David Soares (DEM-SP) – filho do pastor evangélico R. R. Soares – para uma reunião no Palácio do Planalto, no dia 27 de abril.

 

De acordo com a matéria, na referida reunião, o presidente da República teria cobrado do órgão Receita Federal uma solução para as dívidas de igrejas evangélicas inscritas em Dívida Ativa e em processos administrativos no âmbito do CARF.

 

Caso seja verdadeiro, tal fato não nos surpreende, uma vez que a tentativa de interferência nas instituições republicanas tem sido uma prática recorrente deste governo. O que nos surpreende é a completa ignorância do presidente da República sobre o funcionamento das instituições nacionais e, em particular, da Receita Federal.

 

Em primeiro lugar, a Receita Federal não é uma instituição de governo, mas de Estado. Portanto, não está vinculada à vontade dos governantes, e sim, à legislação, em seu sentido mais amplo: à Constituição, às leis e às normas infralegais.

 

Da mesma forma devem ser compreendidas as funções inerentes às autoridades tributárias que compõem a estrutura da Instituição, cujos cargos são também de Estado, e não de governo. E, embora vinculados aos legítimos – e legais – programas e projetos tributários de governo, a estes não se subordinam se não estiverem em perfeita consonância e harmonia com a legislação.

 

Caso se comprove a notícia sobre a exigência presidencial para que a Receita Federal solucione as dívidas das igrejas, há outro componente que ratifica a completa ignorância do governante sobre o funcionamento da Instituição. Ocorre que as dívidas inscritas em Dívida Ativa e em fase de julgamento encontram-se fora do âmbito da Receita Federal, uma vez que estariam sob a guarda da Procuradoria da Fazenda Nacional e do Carf – ou seja, instituições que não são vinculadas à Receita Federal do Brasil.

 

Assim sendo, mesmo que tivesse autoridade para “solucionar” dívidas de qualquer contribuinte, neste caso concreto a Receita Federal estaria impedida, em razão das dívidas mencionadas estarem fora de sua área de competência.

 

Para finalizar, e demonstrando a ilegalidade da proposição, convém lembrar que o lançamento tributário regularmente constituído nos termos dos arts. 142 a 144 Lei nº 5.172, de 25/10/66 (Código Tributário Nacional), somente pode ser revisto, suspenso ou extinto nas hipóteses previstas nos arts. 145, 151 e 156 do mesmo diploma legal.

 

Qualquer “solução” fora destas hipóteses consiste em desrespeito à lei e, se praticada por agente público, constitui-se em ato de prevaricação nos exatos termos do art. 319 do Código Penal.

 

O posicionamento da diretoria da DS/Rio é corroborado pela Direção Executiva do Sindifisco Nacional, que se pronunciou sobre o assunto por meio do texto “Tentativa de ingerência na Receita Federal atenta contra a legalidade e a moralidade pública”.

 

Vamos acompanhar os desdobramentos da questão, com a certeza de que o fato noticiado é gravíssimo para a Receita Federal e a nação”.

 

Ouça o comentário de Anderson Gomes:

 

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