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A relação do Jair Bolsonaro com as Forças Armadas nunca foi de paz e amor. Não por acaso o ex-capitão quase foi expulso do Exército no final dos anos 1980 por atentar contra a corporação. Na sua gestão como presidente da República, ele não mudou muito sua atuação com os fardados. É o que mostra a jornalista Malu Gaspar, na sua coluna publicada ontem (12) pelo jornal O Globo, que tem o título “Militares atuam como buchas de canhão para o golpismo de Bolsonaro”. O texto diz o seguinte:
“A estratégia que Jair Bolsonaro desenhou para chegar às eleições em condições de vencer o pleito ou melar o jogo é conhecida: criar tumulto atrás de tumulto, espalhar focos de desconfiança e dispersar a atenção dos assuntos que realmente importam. Vem sendo assim desde o começo do governo.
Toda vez que o presidente da República depara com um problema que não sabe ou não quer resolver, aciona o botão do pânico. Só que quem entra em pânico somos nós. E só continua funcionando porque sempre tem algum fardado disposto a ajudar o presidente em suas tentativas de criar o caos.
A história se repetiu na última polêmica em torno da segurança do sistema eleitoral. Bolsonaro lançou a bomba aproveitando-se da confusão criada pelo perdão presidencial ao deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) e da fala do ministro do STF Luís Roberto Barroso, para quem as Forças Armadas estavam sendo orientadas a atacar e desacreditar o processo eleitoral.
Em discurso no Palácio do Planalto, difundiu a ideia de que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) apura os votos numa sala secreta que não existe, citando uma proposta de apuração paralela pelas Forças Armadas que também nunca foi feita.
Ao mesmo tempo que TSE e interlocutores do Judiciário e do Congresso tentavam desfazer o tumulto com notas de esclarecimento e encontros a portas fechadas, outro general, Heber Portella, enviava ofícios desaforados ao TSE demandando explicações sobre supostos riscos e fragilidades no sistema eleitoral.
Embora fosse o representante dos militares na famigerada Comissão de Transparência do TSE, o general adotou um tom que a hierarquia da força não lhe autoriza:
“Os militares recomendam previsão e divulgação antecipada de consequências para o processo eleitoral, caso seja identificada alguma irregularidade na contagem dos votos da amostra utilizada no Teste de Integridade, haja vista que não foi possível visualizar medidas concretas no caso da ocorrência de referidas irregularidades”.
Desde então, o ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, tomou para si a interlocução com a Corte eleitoral, desautorizando Portella. O TSE explicou que parte das sugestões já havia sido implementada e outra parte era inviável, expondo a falta de conhecimento técnico do general sobre o sistema.
Os aliados do ministro da Defesa afirmam que, com seu movimento, ele busca atuar como anteparo institucional ao golpismo de Bolsonaro. Se é essa a intenção, talvez seja o caso de ele refazer o mapa do campo minado e reforçar o estoque de escudos, porque o presidente não só não gosta de anteparos, como tem por hábito implodi-los.
Não é preciso buscar algum de tantos exemplos do passado para ilustrar essa afirmação. Ontem mesmo Bolsonaro descartou um desses “escudos institucionais” ao demitir o almirante Bento Albuquerque do Ministério de Minas e Energia.
O almirante tentava conter os arroubos intervencionistas do presidente, que nunca se conformou com a política de reajuste dos combustíveis da Petrobras acompanhar as cotações do barril do petróleo e do dólar.
Por um tempo, deu certo. Até que parou de funcionar.
A razão mais evidente para a saída de Albuquerque foi o aumento de 8,9% no preço do diesel, alguns dias depois de Bolsonaro ter pedido em sua live que não houvesse mais reajustes e de ter chamado de “estupro” o lucro de R$ 44,5 bilhões da Petrobras.
Também se falou numa queda de braço com lideranças do Centrão em torno do projeto que destina R$ 100 bilhões do pré-sal à criação de uma rede de gasodutos que atenderia aos interesses do empresário Carlos Suarez.
Seja qual for a bomba que eliminou o escudo, só veio reforçar a constatação de que o presidente da República não está nem aí para a cor da farda ou para a patente que ela exibe.
Apesar de gostar de dizer que aprendeu na caserna o valor da lealdade, ou que não deixa seus homens na estrada, a verdade é que, para Bolsonaro, o militar só é útil se lhe presta obediência incondicional.
Se resolver priorizar os interesses nacionais ou o respeito às instituições da República em vez de criar o caos, o sujeito estará fora. Será igualmente descartado assim que o tumulto da vez for superado.
A esta altura, o mais incrível não é nem que seja assim. Impressiona é que ainda haja militares que acreditam ser capazes de conter de forma civilizada os impulsos destruidores do presidente. Não percebem que, em vez de anteparos, o que são é bucha de canhão”.
Ouça o comentário de Anderson Gomes: